Por (*) João Bosco Leal
Residindo
perto do Pantanal Sul Mato Grossense, de belezas naturais deslumbrantes
e muitos animais silvestres, resolvi convidar uma amiga de juventude
para passar um feriado prolongado em minha casa e assim nos reveríamos e
ela conheceria o pantanal.
Pretendia mostrar locais que conheço sem
nenhuma programação previamente agendada, passeando, parando, tirando
fotos, mostrando o que lhe era desconhecido, sem nenhum compromisso de
horários, mas como chovia e fazia frio quando a aeronave que a trazia
pousou, percebi que a programação teria que ser alterada.
Como duas pessoas que não se viam ou
tiveram qualquer tipo de contato há trinta e sete anos, fomos almoçar e
começar a conversar sobre o que ocorreu em nossas vidas nesse período e
também sobre o que ela gostaria de fazer já que com aquele tempo a
programação anterior não seria aconselhável.
Durante essa conversa, por algumas
declarações e comportamentos, já percebi que meu convite talvez não
tivesse sido uma boa ideia. Notei que havíamos vivido em mundos e
culturas diferentes por um período demasiado longo, o que tinha nos
transformado em duas pessoas com uma quantidade enorme de diferenças.
Morando só e já próximo dos sessenta,
nada mais lógico e esperado que possuísse algumas ou muitas manias, mas
tentei colocar minha convidada muito à vontade, mostrando-lhe seus
aposentos e onde encontraria tudo o que pudesse necessitar, desde
alimentos, bebidas, pratos, talheres e como funcionava a máquina de
café.
Por simples bom senso e educação que se
espera de quem possui um grau cultural elevado, ou até mesmo por
conhecimento prático adquirido durante a vida, imaginei que alguns
comportamentos não ocorreriam por serem inesperados para quem se hospeda
em casa alheia, independentemente das manias adquiridas por quem está
acostumado a viver só como eu.
Morando só no interior do Paraná logo
notei que acostumada a viver em casa, não tinha noção do que seria viver
em um prédio de apartamentos, mas diversas atitudes comportamentais por
mim inesperadas confirmavam minha primeira impressão: éramos pessoas
totalmente desconhecidas.
Como o clima frio e chuvoso não a
estimulavam sequer a sair do quarto por longos períodos, solicitei a
presença de outra amiga e demos algumas voltas pela cidade, visitando
locais interessantes e pontos turísticos, mas foi tudo o que
conseguimos, pois no dia seguinte o tempo melhorou e o sol voltou a
brilhar, mas ela não se interessou pelo passeio turístico que eu havia
programado para o Pantanal alegando que preferia permanecer quieta,
dentro de casa.
Pensei então sobre todo o período que
estivemos longe, morando em ruas, cidades e estados diferentes,
estudando em escolas e cursos, tendo amigos e relacionamentos mais ou
menos profundos ou duradouros, com idades e em épocas distintas.
Com todas essas variações de estilos,
meios e modos de vida, realmente não poderíamos mais ser o que éramos e
pensar ou agir como costumávamos fazer.
Uma pena, pois a intenção era a melhor
possível e ao invés de reaproximar, certamente acabou afastando mais
ainda duas pessoas que já não se viam há décadas, mas que mantinham
lembranças de um tempo diferente, quando éramos jovens e que
infelizmente nunca voltará.
Tentar reviver o passado pode fazer perder lembranças que na mente se mantinham bonitas e por isso lá deveriam permanecer.
(*) João Bosco Leal -
jornalista, reg. MTE nº 1019/MS, escritor, articulista político, produtor rural
e palestrante sobre assuntos ligados ao agronegócio e conflitos agrários.
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